Mama África - Homenagem Dia das Mães

Maio, 01 2021

"Mama África" é um termo usado no continente africano para aquelas mulheres poderosas, de voz potente, que todos param para ouvir, que se fazem obedecer sem muito questionamento, que fazem acontecer.


E nós temos uma "Mama África" bem aqui, do nosso lado, seu nome: Luana Preterotti.


Nossa Mama África nasceu em novembro de 2015, em nossa primeira viagem ao país que chamamos hoje de casa.

Ao acaso, como muita coisa aconteceu em nossa vida desde então, e com nossos corações abertos ao que o destino nos apresentasse, fomos a Maboguini, região rural de Moshi, para conhecer um orfanato que estava iniciando suas atividades.



Dentre todas as quarenta e poucas crianças que existiam lá, uma chamou a atenção da Luana. Pequena, com os olhos meio tímidos e levemente tristes. Seu nome era Aziza, orfã, neta da Bibi, cozinheira do orfanato. Não sei exatamente em que momento isso aconteceu, se foi a Aziza que foi para o colo da Luana, ou a Luana que pegou a Aziza no colo, mas quando percebi as duas estavam grudadas. Naquele exato momento, sem ninguém perceber, nascia nossa Mama África.


No nosso retorno para a cidade, o casal de americanos, que lideravam aquele orfanato, me contou toda a história da Aziza. Compartilhei com a Luana com a frase: "- Você quer saber mesmo a história da Aziza? Será um caminho sem retorno. " Ela disse que sim, afinal, quem estava respondendo naquele momento não era mais a Luana, mas nossa recém nascida Mama África.



Mama África chorou por uns dois dias ao imaginar que sua Aziza poderia estar em sofrimento ou que poderíamos deixá- la ali sem nosso apoio. Não havia muito o que fazer a não ser emanar amor. E isso fizemos.



Voltamos mais uma vez ao local, desta vez levando material escolar para apoiar o orfanato que estava iniciando um trabalho de reforço escolar para os mais velhos. Mama África ficou mais uma vez o tempo todo com a Aziza no colo. Não sabíamos mais como nos desgrudar dela, mas isso seria inevitável.



Mama África passou a pensar dia e noite como poderíamos fazer o melhor para aquela e para outras crianças. Estar no Brasil de volta nos fez questionar nossas vidas "normais". Pouca coisa fazia sentido. Queríamos voltar para a Tanzânia. Mama África queria saber diariamente o que ocorria com as crianças que queríamos chamar de nossas. Algumas informações vinham desencontradas até que descobrimos que o orfanato que nossa Aziza era acolhida havia se fechado. Mama ficou inconsolável, obstinada a encontrá-la novamente.


Os anos se passavam e diversas coisas se colocavam em nosso caminho para que Mama África estivesse pronta para tomar as rédeas de parte do nosso destino.



Mama África então se tornou mãe realmente. Ela diz que não queria, não se imaginava mãe, não entendia como aquilo estava se encaixando nos planos dela de voltar a África e ao lugar que chamaria de casa. Mas parece que tudo estava se desenrolando para que em algum momento ela tivesse a coragem que uma Mama tem para fazer qualquer coisa para defender suas crias.

Em um dia comum de caos na toca da Leoa Mama África, no processo de amamentação, na rotina de conseguir informações de casa, ela descobre que a escolinha, que havíamos acompanhado o nascimento pelas mãos de nossa amiga Neema, iria fechar por falta de recursos financeiros. Tudo fez sentido agora! Toda a preparação inconsciente, todas as dificuldades e acontecimentos, serviram para ela ter a coragem de dizer: "- A escolinha não vai fechar. Eu vou manter a escolinha funcionando. A escolinha é nossa. "



Mama África, com a força de suas expressões e com o poder dado a ela, me diz ao chegar em casa: "- Senta que precisamos conversar. A escolinha da Neema é nossa. "

O que eu disse não importa, quem estava no comando era Mama África. Quem em sã consciência ousa discordar da Mama? Eu não queria discordar. Meu papel foi de abraçar o sonho dela lá em 2015. Eu fui colocado nisso tudo por ela. O sonho dela me fez viver um sonho meu adormecido. Ela me fez ter os meus próprios sonhos e eu não ousaria não segui-los de mãos dadas com ela.


Ao longo do tempo vi Mama África defender suas crias com unhas e dentes. Ao longo do tempo vi lágrimas de alegria e tristeza por realizações e frustrações, por não poder fazer mais por seus filhos.



Mama e eu reencontramos Aziza em 2019, longe da nossa escolinha, morando de favor com sua irmã mais nova e com sua avó Bibi. Em mais um impulso de coragem Mama ofereceu trabalho pra Bibi e apoio para as meninas em nossa escolinha.

Pronto, Mama África estava completa com suas enormes asas abraçando todos ao seu redor.

Hoje Mama África tem mais a sorrir do que chorrar. Está satisfeita pelas realizações de seus filhos.

O choro vem só das saudades.

Do poder de criar uma criança apenas, Mama África passou a ter poderes de criar mais de cem.

E não é fácil sentir saudades de mais de 100 filhos.